domingo, 23 de outubro de 2011

Crise ética e a crise da ética



Só de sacanagem - Elisa Lucinda

Meu coração está aos pulos!
Quantas vezes minha esperança será posta à prova?
Por quantas provas terá ela que passar? Tudo isso que está aí no ar, malas, cuecas que voam entupidas de dinheiro, do meu, do nosso dinheiro que reservamos duramente para educar os meninos mais pobres que nós, para cuidar gratuitamente da saúde deles e dos seus pais, esse dinheiro viaja na bagagem da impunidade e eu não posso mais.
Quantas vezes, meu amigo, meu rapaz, minha confiança vai ser posta à prova?
Quantas vezes minha esperança vai esperar no cais?
É certo que tempos difíceis existem para aperfeiçoar o aprendiz, mas não é certo que a mentira dos maus brasileiros venha quebrar no nosso nariz.
Meu coração está no escuro, a luz é simples, regada ao conselho simples de meu pai, minha mãe, minha avó e os justos que os precederam: "Não roubarás", "Devolva o lápis do coleguinha", "Esse apontador não é seu, minha filha". Ao invés disso, tanta coisa nojenta e torpe tenho tido que escutar.
Até habeas corpus preventivo, coisa da qual nunca tinha visto falar e sobre a qual minha pobre lógica ainda insiste: esse é o tipo de benefício que só ao culpado interessará. Pois bem, se mexeram comigo, com a velha e fiel fé do meu povo sofrido, então agora eu vou sacanear: mais honesta ainda vou ficar.
Só de sacanagem! Dirão: "Deixa de ser boba, desde Cabral que aqui todo mundo rouba" e vou dizer: "Não importa, será esse o meu carnaval, vou confiar mais e outra vez. Eu, meu irmão, meu filho e meus amigos, vamos pagar limpo a quem a gente deve e receber limpo do nosso freguês. Com o tempo a gente consegue ser livre, ético e o escambau."
Dirão: "É inútil, todo o mundo aqui é corrupto, desde o primeiro homem que veio de Portugal". Eu direi: Não admito, minha esperança é imortal. Eu repito, ouviram? Imortal! Sei que não dá para mudar o começo mas, se a gente quiser, vai dar para mudar o final!




As duas frases apesar de parecerem ter o mesmo sentido e estarem interligadas, tem significados diferenciados. Quando nos referimos à crise ética, em suma estamos falando dos valores morais que deixaram de ser seguidos. Quando nos referimos à crise da ética nos referimos justamente a isso, os valores estão tão distorcidos e corrompidos, que há muitas vezes uma confusão do que é ético ou não. Há uma falta de identidade dos valores morais a serem seguidos.

As pessoas estão perdidas, não sabem muitas vezes a simples diferença entre o que é certo e o que errado, muitas vezes mesmo sabendo diferir cada uma destas situações optam por simplesmente ficar em cima do muro, ou apenas fechar os olhos para tudo o que está nos acontecendo. Preferem seguir o que comanda a massa, ser diferente se tornou algo ruim, fazer a diferença se tornou algo inútil. Quando penso em ética me vem à mente vários momentos presenciados, por exemplo, quando se fala em corrupção, o povo está tão acostumado com a roubalheira na politica que se tornou comum a seguinte afirmação: Quer roubar, roube, mas que pelo menos faça alguma coisa. Isso nada mais é que a crise ética que vivemos, os valores estão confusos, as pessoas tendem a seguir um meio termo. A solução está dentro de cada um de nós, mas ninguém quer dar o primeiro passo. Achamos que se todo mundo faz, também podemos fazer. Se eles podem, nós também podemos, mas ninguém se questiona se devem, se é certo, se é ético.
Identifiquei-me com o poema, na verdade identifiquei nele a educação que recebi, os valores que me foram passados. Toda vez que chegava da escola minha mãe olhava meu caderno de atividades e meu material escolar, se estivesse faltando algo, ela questionava, se estivesse sobrando, também. Já fui acompanhada por minha mãe na escola só para devolver uma borracha que não era minha, seguida das minhas desculpas.
Sou do tempo em que criança não se metia na conversa de adulto, e se falasse palavrão tinha um bom castigo garantido. Hoje vejo isso muito pouco, os pais preferem não repreender os filhos, namorar aos 12 anos é normal, ter filhos aos 15 é natural, o ruim mesmo é ir de encontro a eles, é dito que é pior, eles podem ficar revoltados. Aonde vamos parar?
Quais os valores que seguimos hoje? O que é certo? O que realmente é errado? Isto tudo que questiono é a ausência da identidade e da clareza racional dos valores éticos, é verdadeiramente o que podemos chamar de crise da ética. Onde a maioria fecha os olhos para não ver, tapam os ouvidos para não ouvir e reprime a voz para não destoar da massa, será que desta forma estamos sendo éticos ou covardes? Ficar prostrado e fingir que não está acontecendo com a gente nos faz menos culpados?
Não, definitivamente não. A mudança é vagarosa, quase impossível de ser feita de forma radical, mas é preciso que demos o primeiro passo. Desta forma que nós possamos repensar nossos princípios, para que possamos fazer a diferença neste mundo que caminha Deus sabe para aonde.



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